terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Aprendi um verbo novo com umas pessoas de dezenove anos. São muito invencionistas essas pessoas de dezenove anos.
O verbo é
Pelasaquear.
Já conhecia o substantivo péla-saco, mas não o verbo, e não encontrei dificuldade para aplicar. Ô. Na verdade, ele estava nas arestas do meu cérebro, eu só não tinha reparado.

Exemplos:
O aluno pelasaqueia o professor todo dia.
Po, a Lis me pelasaqueou usando esse vestido.

Fim.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Tá quente, muito quente.
E não tem nenhum camelô de prendedor de cabelo em Botafogo. O que houve com os camelôs? Tem mais camelô de almofada e meia do que de elástico de cabelo.
Eu não consigo comer com o cabelo solto. De jeito nenhum. Nem com a maior das etiquetas garfo-boca-postura. Não dá.
Pensei em raspar, passar máquina zero, para então poder me alimentar. Há muitos cabeleireiros em Botafogo, bons e baratos.

O corte ficou decente. Já o suflê de cenoura, nem tanto.

sábado, 14 de novembro de 2009

Um pote de cereais, por favor, um pote de cereais pra enxaqueca leve.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Nunca tinha visto alguém chorar na praia.
Quer dizer, não em finais de semana.
Normalmente as pessoas choram na praia em dias úteis, mais provavelmente no final da tarde. Não em um sábado de sol futevôlei biquininho olha o mate. ela, entretanto, parecia não se importar com as regras de Ipanema. Chorou. E eu tive de me esforçar pra fingir que não estava vendo.

Chora-se em finais de semana e feriados, em Ipanema.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

bulha

Adorei a palavra que eu aprendi hoje. Bulha. Parece lilás. Já gostava de pulha, mas bulha também é sedutor.

bulha
bu.lha
sf (cast bulla) 1 Confusão de sons; ruído. 2 Altercação, briga, desavença. 3 Desordem, motim.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

O alô

Já passava da meia noite quando o telefone tocou. Eu estava na sala lendo, ainda bem acordada. Agora só leio na sala, pois a lâmpada do quarto está muito fraca. Não tive muita preguiça de levantar e ir até o quarto para atender. O telefone fica ao lado da televisão, em uma mesa de criança almoçar, que eu achei quando cheguei no apartamento.
Alô?
Acho que apenas umas cinco pessoas tem o número desse telefone fixo - minha família, dois ou três amigos, o chefe. Essa é uma das vantagens de mudar de casa: ninguém sabe direito onde eu moro, ninguém tem o número do meu fixo. Nunca recebi trotes, telefonemas em horários inapropriados, ameaças de sequestro, propostas de adoção de famintos africanos, votos de feliz natal. Vou continuar no anonimato telefônico.
Alô!
A pessoa do lado continuava em silêncio. Eu estava curiosamente de bom humor, e não mandei meu interlocutor à merda, como ele - ou ela - merecia. Simplesmente dei uma pausa, pois sabia que havia alguém do outro lado, e que esse alguém estava gostando de escutar a minha voz e o meu silêncio, estava gostando de saber que interrompeu a minha leitura, embora àquela hora eu também pudesse estar lavando roupa, tomando banho, e nesse caso o telefone estaria molhado. Não disse isso à pessoa do outro lado. Mas a minha voz, sem que eu tivesse planejado, ficou mais melosa, com o A mais forte:
Alô.
Tudo bem. Essa é a brincadeira. Eu não sei quem você é, você sabe quem eu sou. Quando estava na sétima série, fiz isso algumas vezes. Eu era apaixonada por um menino uns dois anos mais velho, de olhos azuis e peitoral de nadador, que se chamava Diego. Dei um jeito de roubar a carteirinha escolar dele, descobrir o telefone, e ficava ligando pra casa dele só para escutar seus seguidos alôs. Diego era tão desejado e soberano, o gato da escola, por quem todas as meninas suspiravam. E ficava tão ridículo no telefone, falando alô para o silêncio. Perturbado, dizia alôs rápidos, perguntava quem era. Eu ria baixinho, do outro lado da linha. Gosto do ridículo. Humaniza.
Alô-ou.
A pessoa do outro lado existe, e tem alguma curiosidade sobre mim. A pessoa do outro lado talvez queira me chamar pra tomar um porre, ou para uma sessão do descarrego, para fazer risoto de funghi, ou quem sabe para ler poesia em voz alta. A pessoa do outro lado gosta de mim e sabe que eu sou tão ridícula quanto ela.
Clara?

sábado, 26 de setembro de 2009

Eu estou escutando uma cigarra.

Tenho a impressão de que, no Horto, as pessoas são mais felizes. Ou têm a obrigação contratual de serem mais felizes, porque é o bairro mais bonito do Rio. É sacanagem ficar infeliz aqui, com essa mata, com esse jardim.

Mas isso é só até o final da Pacheco Leão. Depois, já pode ser triste puto cheio de angústia de novo.

Estou escutando outra cigarra.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

eu vou te dizer uma coisa, tá?
e você finge que não escutou.
eu preciso muito te contar. mas só se você jurar que não vai escutar.
não, não é maluco. todo mundo fala coisa que não deve ser ouvida. só que agora eu tô te avisando.
você é bom de fingir?
então lá vai:

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

marsupial

Marsupial.
Adoro essa palavra.
Trocaria meu nome por ela.
Trocaria todos os nomes do mundo por ela.
É como um sopro desviado.
Clara toma café sem açúcar na xícara que suja a mesa.
Marsupial toma café sem acúcar na marsupial
[a parte que suja eu teria que tirar, não combina com marsupial].
Vou tentar outra frase assim que a gripe acabar.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Hoje, na Rua das Laranjeiras, a placa

Abro orkut
Abro msn
Faço currículo

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Que horas eu vou parar de escutar Bob Dylan? você sabe? se vc soubesse, vc me contaria? que horas, hein? que horas?

Notícias do front:
promoção de sabonete supimpa na drogaria pacheco. Vale a pena.
E mais não digo.

domingo, 9 de agosto de 2009

Lavar bem, deixar de molho. Enxaguar. Torcer. Pendurar. Eu não trouxe o pano de prato. Mas talvez seja desnecessário. Pano de prato. É que nem escorredor de prato. Não precisa, as coisas escorrem sozinhas, ora. E a fronha nem sempre combina com o lençol. Banho muito quente, banho pelando. O tapete do banheiro, sim, é fundamental. A net não chega hoje? Peraí, a do celular só vence na semana que vem.

Vai, solidão, vai, vira minha amiga, por favor.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

O que eu senti hoje, às sete e quinze da manhã, na Urca, enquanto corria de cabelo preso e óculos escuros, ao cruzar com um militar de aparência séria e um pouco tristonho, que carregava bordado em azul na camiseta o nome de guerra Souza Lima:

cheiro de colônia de homem feito.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

voce entrou na loja de travesseiros e colchas espumadas.
Eu queria entrar,
mas não podia.

terça-feira, 30 de junho de 2009

palavras que descrevem uma cólica:

agulhada
dor
torce
contorce
pontada
latente
nada
dor
nada
calmavaipassar
cansaço
explosão
zumbido
contínuo
fininho

é,
não se pode ter cólica em alemão.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

José e seus amigos invisíveis

Rafael tem fixação por pipas.
Bel define as pessoas pelo ascendente.
Lila não consegue fazer refeições com o cabelo solto.

terça-feira, 9 de junho de 2009

o triturador de sentimentos

O que fazer quando você está sentindo uma coisa
que sabe que não devia estar sentindo,
mas já está sentindo aquele negócio,
e não quer mais sentir:

pegar o triturador de sentimentos.

O meu fica na terceira gaveta de baixo pra cima.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

E aí?
Oi.
Oi. E aí?
Sabe quem tá falando?
Sei, po. É você.
Ah, é. Esse negócio de bina. Não me acostumo. Tira a graça.
Diga, conta!
Pois é. Então. Eu não tenho nada pra falar.
Nada?
Nada.
Ah, sim.
Eu não tenho nada pra falar, mas quis ligar pra você. Aí, pum, disquei, liguei.
Rá-rá. Maluquete.
Maluquete? Acho que nem meu avô diz isso.
É quando a pessoa é maluca, mas do bem.
Não, isso é maluco beleza.
Mas você não é maluca beleza. É maluquete.
Olha. Me ocorreu uma rima estranha pra maluquete.
Rima. To falando: você é maluquete. Fala coisas doidas.
Aí é doideira. Fulano é doidão, doidaço. Eu não sou doideira.
Verdade. Isso só de vez em quando.
Então me liga quando souber o que é maluquete, tá?
Tá bem.
Um beijo.
Beijo, maluquete.
Tchau.

E a pista da Pedra da Urca continua sendo o melhor lugar para correr.
Ver o casal que no km 1 estava se separando,
ver a banda de heavy metal gravando um clipe,
ver os alpinistas contundidos que querem chegar no céu,
escutar pink floyd quando o sol está na metade do pôr,
e dizer pra criança de quatro anos que no mato tem muita cobra.

Na pista da Urca tem gringo e velhote com contador de batimentos,
mulheres com tênis extra anatômicos amortecidos coloridos,
recém-namorados tentando criar intimidade enquanto vêem o mar,
(eles não sabem que assim é mais difícil).
também tem bebês com frio
e os gafanhotos cantores de fado,
com quem muito dialogo.

E depois do sol baixar, pingando de suor, é possível ver a pior marcha de todos os tempos: a dos militares que tiram a bandeira do Brasil da haste, ali no Forte.
São quatro moços fardados fracotes mal-humorados que escutam um apito e marcham com o corpo mais molengo que uma minhoca infartada, e com mais má vontade que os garçons do Bar Lagoa, e dobram a bandeira, como quem quer cuspir. Mas não cospem. Os covardes.

domingo, 24 de maio de 2009

os ansiosos

Pessoas ansiosas suam.
Falam depressa.
Têm tiques. Mesmo que discretos.

Pessoas ansiosas não sentem o sabor da comida que está na boca, mas da que está no garfo, prestes a ser engolida. Bacalhau com paladar de feijão. Arroz com gosto de laranja. Tais pessoas, coitadas, degustam na língua algo que não é mais que um pensamento.

Ainda bem que deixei de ser ansiosa.
Já faz cinco minutos.

Doação

Esse cartaz eu vi na Rua das Laranjeiras.

Doação de sangue
Doe aqui!
Aos sábados, doação com banda ao vivo e café da manhã grátis.


Agora sim, vão ganhar um bolsão de ó negativo.
Só espero que a música ao vivo não instigue a dançar.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Lá vem a Diana

Diana de Hollanda, escritora e amiga mais que querida, foi premiada no concurso literário do Prêmio Fórum de Ciência e Cultura, com sua obra Não saber a morte . É um blog, uma obra de literatura digital, que tem como tema o Palácio Universitário da Praia Vermelha (tema do concurso). A Di usou uns trechos do Diário do Hospício, do Lima Barreto, e escreveu outras tantas prosas e versos, e fez tantas outras conexões e eu não vou falar mais, vocês que leiam com o próprio estômago. Novas formas de literatura. Vamos experimentar.

(Viva! Tim-tim!)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Pior que ter bloqueio criativo é ter uma idéia que não vai pra lugar nenhum.
Há três meses eu tenho o título de um conto: O pai só toca piano quando falta luz. E daí? Nada. Nao sei o que fazer com isso. Não vira nada, mas continua ali, dizendo que é uma idéia. Na boa, o bloqueio é bem menos aflitivo.

*

E por falar em falta de luz, aposto que eu sou a única pessoa que sabe que ontem, de 3h às 6h30, faltou luz em Botafogo. Porre devidamente tomado, eu procurava um simples vaso sanitário, no rotineiro espaço da minha casa. No escuro, virou uma terrível saga. Procurar velinha pra acender? Impossível. Lanterna? Acho que emprestei pra alguém. Moral da história: nunca tomem porre em dia de falta de luz. Recomendo ligar pra Light antes.

domingo, 17 de maio de 2009

Então nao aguentou: pousou a cabeça no travesseiro. Era um outono. Ingrato.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Abrir a água, esperar aquecer, testar.
Pulso, nuca.
Sabonete, braços, perna, tronco. Shampoo, vou comprar um novo desse, que cheiro ótimo, esponja, espuma, um pedacinho de uma música, ai esse Djavan, essa mala não me sai da cabeça. Sabonetinho do rosto número um, testa, maçã do rosto, meu queixo anda oleoso, será que essa idéia que tive pro episódio vale a pena mesmo? Sabonetinho do rosto número dois, toalha, creminhos.

Abrir a água, esperar aquecer, testar.
Saco plástico.
Banquinho.
Po, quem tirou o raio do banquinho daqui? Não, claro que eu não tava fazendo experimentos, traz de volta por favor. Ajeitar o saquinho, ver se entra água, colocar o pé no banquinho. Sabonete. Esponja. Braços, tronco, perna. Não, perna não. Muito difícil, deixa sujo. Ninguém vai reparar em uma perna suja. Pé. Não, muito longe, pé vive no chão mesmo, e no outono eu coloco sapato fechado. Como é a música-grude do Djavan? Não tá vindo, não tá vindo. Shampoo. Putz, vou ter que virar pra pegar. Se virar, posso torcer meu outro pé. Ok, sabonete no cabelo, shampoo pra quê?, shampoo é coisa de burguês, aliás eu devia escrever xampu, viva a cultura nacional. Mãos lavando o cabelo. Nem tanto, olha que desliza. Ops. Dessa vez foi quase. Sabonetinho do rosto. Ai. Deixei do lado de fora na última vez que tirei a maquiagem. Alguém pode por favor pegar o sabonete pro rosto? Algué-ém! Obrigada. Pronto. Não uso mais maquiagem, coisa de burguês, sou uma intelectual marxista. Tirar o pé do banquinho, tirar o saquinho, toalha. Curativo molhado. Cacilda. Se essa meleca molha e deforma e entorta o meu dedão. Se. Creminhos. Não, creme nenhum, eu não preciso de pele sedosa, preciso de um dedão. E da próxima vez, banho de gato.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Mena Barreto

Mistério insondável: por que a Mena Barreto vive engarrafada? Por que ela engarrafa mesmo quando as demais ruas de Botafogo estão livres, como em madrugadas e feriados internacionais? Seria culpa dos engenheiros de tráfego, ou dos duendes causadores de engarrafamento? Será que um dia desenvolveremos asas, para poder atravessar a Mena Barreto? Quem, afinal, foi Mena Barreto?

***

A vantagem de morar no alto Botafogo é que, depois de subir toda a ladeira, e ver essa lua, com essa enseada, eu quase esqueço que a Mena Barreto existe.

terça-feira, 5 de maio de 2009

25!
Preciso de um creme hidratante novo.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Chorar não faz sentido

Chorar não faz sentido.
Não digo que não faz sentido porque as razões do choro não valem a pena; cada um que julgue seus motivos, ora.
O que não faz sentido é o sujeito ficar angustiado, triste, muito deprimido e, no ápice da tristeza, sair água do olho.
Você fica triste e sai água do seu olho. Não encaixa.
Acho que um substituto mais coerente para o choro seria a pedra no rim. Você fica triste, muito triste, e começam a acumular pedras no seu rim (que depois são expelidas, quando a tristeza vai embora). Ou, melhor, o crescimento desenfreado das unhas. O sujeito se desespera e lá vão as unhas, crescendo sem parar.
O que não dá para entender, definitivamente, é essa aguinha que embaça tudo. Salgada, ainda por cima. E sem trema.

*
Infelizmente, terei que continuar dando crédito ao choro. Tudo por causa da fala mais bonita de Pluft, o fantasminha, peça clássica da Maria Clara Machado. Pluft vê Maribel chorando e diz à Mãe Fantasma: Mamãe, a menina está colocando o mar todo pelos olhos!
Pelo Pluft, continuemos chorando. E não com unhas enormes. Que poderiam até ser divertidas.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Algo mais bonito que o outono no Rio?

sábado, 25 de abril de 2009

Nise, não lamentes seu estado

Uns versinhos do satírico, erótico e boca-suja Bocage, que acabo de tirar da estante. Nise, não lamentes seu estado.
Com amor, para os mais puritanos leitores do brógui.

*

Não lamentes, oh Nise, o teu estado;
Puta tem sido muita gente boa;
Putíssimas fidalgas tem Lisboa,
Milhões de vezes putas têm reinado:

Dido foi puta, e puta d'um soldado;
Cleópatra por puta alcança a c'roa;
Tu, Lucrécia, com toda a tua proa,
O teu cono não passa por honrado:

Essa da Rússia imperatriz famosa,
Que inda há pouco morreu (diz a Gazeta)
Entre mil porras expirou vaidosa:

Todas no mundo dão a sua greta:
Não fiques pois, oh Nise, duvidosa
Que isso de virgo e honra é tudo peta.

Em cena no Rio

Um post preguiçoso sobre três peças que vi recentemente.

Vi Hamlet, dirigida pelo Aderbal Freire, com Wagner Moura no papel principal. Eis um Hamlet, o louco são, o ardil que passa do questionamento à ação, o diretor e ator de sua própria tragédia. O uso da câmera foi apropriado e bem feito, não me deu ânsia de vômito. Gostei. Bastante.

Vi Rock´n Roll, do Tom Stoppard, dirigida pelo Felipe Vidal e mais um cara. O texto é genial, a peça é bem feita, embora com soluções cênicas um pouco aborrecidas. Dei um certo azar: vi em um dia em que os atores estavam meio mal. O Thiago Fragoso quase leva um lustre na cabeça. É teatro, a cada dia acontece uma peça diferente, reze pelo dia em que você for ver alguma coisa.

Vi "In on it", dirigida pelo Henrique Diaz, uma peça de um dramaturgo canadense cujo nome deveria tatuar na testa, assim que souber qual é. Um único comentário sobre o espetáculo: saí completamente transtornada.

Eu ia falar alguma coisa sobre arte e transtorno, ia defender que a arte só existe como algo que rompe o banal, que dilacera o senso comum, mas, como disse no início, estou com preguiça. Então vou pra praia, ali no posto nove de Ipanema. Talvez nove e meio.

Um dia, em uma portaria de um teatro, o porteiro me barrou. Já ia puxando a carteirinha e a identidade quando o cara, blusinha azul claro e calça social preta, me olhou firme: você está de braços cruzados! Em teatro e igreja não se entra de braços cruzados. Só deixo você entrar se descruzar. Podia ter dito que ele não era meu pai nem guarda civil e muito menos ortopedista pra dizer o que fazer com os meus braços, mas simplesmente obedeci, feliz da vida. Ele tem razão.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Pá: ferramenta composta por um cabo e um recipiente depositário, utilizado para enterrar os mortos, desenterrar ossos, colocar areia no baldinho e plantar um pé de feijão.

Outros usos dados ao termo, recentemente escutados:

"Saí com a menina e pá."
"Daí você pega Sartre e pá, pá, pá, só no existencialismo."
"Você pega a primeira a direita e pá, pá, para aquele lado, e já chegou."
"Comigo não tem essa. É pá-pum."

Ou seja,

Pá: aquilo que não se sabe dizer. Substituto universal de todas as palavras.

(e mais respeito com os mortos, por gentileza).

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Eu, Sean, as formigas

Venho por meio desta declarar meu apoio incondicional ao menino Sean.
Não me meto em imbóglios jurídicos e diplomáticos, mas é impossível ficar inerte diante da ameaça de levarem o menino Sean para os Estados Unidos. Essa não é apenas uma questão de direitos da família: é uma questão poético-ecológica, que me afeta profundamente.

Li no jornal, na semana passada, algumas declarações do menino a um bravíssimo comitê de psicólogas: "Na última vez em que estive na casa do meu pai americano, fiz muitas coisas. Joguei vôlei, basquete e joguei formiga na teia de aranha". Pois bem. Se o menino Sean retorna à terra natal, com quem mais eu vou dividir o meu gosto por atirar formigas na teia de aranha?

Tenho uma afeição especial por formiguinhas. Tão pequeninas, tão delicadinhas. Andam em fila, as trabalhadoras. Me demoro a observá-las carregando com esforço um pedaço de folhinha verde, que irá alimentar o bando inteiro. Com carinho e amor, escolho uma delas, tiro a folhinha da carcaça, dou um ligeiro peteleco. A formiga não fica desnorteada, continua andando, embora tenha eu certeza de que está puta comigo. As formigas são assim, não se expressam muito, bichinho orgulhoso. Com algumas, eu disfarço: tiro a folhinha, finjo que não fui eu, vou dar uma volta, até assobio uma canção antiga. Certas formigas são espertas, não posso dar mole.
Atirar formigas na teia de aranha, menino Sean, anda difícil hoje em dia. É preciso juntar duas coisas quase em extinção. Meus criadouros de teia de aranha têm sido lamentavelmente atacados por desinfetantes de última geração, verdadeiras bombas químicas, as pessoas são maldosas, menino Sean. Nunca mais pude treinar fazer uma deliciosa bolotinha de formiga, calcular a força e atirar com precisão no meio da teia de aranha, de modo que ela grude pelas patinhas e fique ligeiramente inclinada, com a cabeça na direção do chão.

Portanto, menino Sean, fiquemos os dois aqui, atirando formigas. Em Botafogo ainda há algumas teias.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

de volta

Estou de volta. Agora ostentando o título de mestre em comunicação e cultura. Preparem-se para textos altamente intelectualizados, todos com base foucaultiana.
Como não sei bem o que escrever nesse post de reabertura, vou colocar aqui uma questão que uma amiga querida, intelectual e artista proeminente, me fez por email:
Que fim levou a Cristina Aguilera?

Tenho algumas sugestões:
1. Levou uma machadada na cabeça.
2. Levou um quebrador de gelo na cabeça.
3. Está cantando e dançando em um cabaré na Lapa de Berlim.

sábado, 14 de março de 2009

ah!

quarta-feira, 11 de março de 2009

Furador

- Fura isso logo.
Estendi minha mão, ele ficou com medo.
- Não. Você é muito delicadinha.
A agulha já estava ajustada no aparelho, depois de muito esforço e muito tempo perdido. Esse é o melhor aparelho que há no mercado, me dizia separando bem as sílabas e certamente repetindo o que o chefe dissera na reunião. Havia perdido a mulher da vida dele para outro, havia arrumado um emprego novo; precisava de conselhos da amiga, precisava entender o funcionamento do produto para uma reunião no dia seguinte, e o Bar Urca se ajustava incrivelmente bem a tudo aquilo. O garçon mal-humorado demorou pra trazer o chopp. Alta concentração, ninguém reparando, meu amigo tirava agulhas de um pacote e ajustava sem habilidade nenhuma naquele furador.
- Ia pedir em casamento, ela veio com essa história de tempo.
- Tava na cara que ela ia acabar. Vai dizer que você não desconfiou?
A agulha escorregou no chão. Ele pegou com um desnecessário guardanapo.
- Ela andava estranha. Mas mulher... vai saber. Podia ser só TPM.
TPM. A culpa sempre é da TPM. Isso é típico de homem machista, que não consegue arrumar outra explicação para as vontades femininas. Quase disse, bem feito, achou que era TPM e levou o maior fora de todos os tempos. Mas mudei de idéia.
- Vai ver você não estava dando atenção suficiente para ela. Esse emprego novo deve estar te sugando a alma.
- Que nada. Dava muita atenção. Principalmente depois do meu caso com a Flavinha. Ficava meio culpado, chegava em casa cheio de amor pra dar.
Finalmente conseguiu colocar a agulha no furador de dedos. Êxito completo, só faltou gargalhar.
- Esse é mesmo o melhor produto do mercado.
Não tenho saco pra essas frases de vendedor, principalmente quando repetidas.
- Dá o resultado da glicose no sangue em cinco segundos. E ajusta para qualquer dedo, do mais fininho ao de pedreiro. O meu deve ser meio termo.
Não queria dizer pra ele, mas não são só os pedreiros que têm mão grossa. Acho que esse não é o tipo de coisa que se diz a um amigo que levou um fora, embora já estivesse achando o pé na bunda muito merecido.
- Tá vendo essa tirinha? Aqui é que tem que colocar o sangue.
- Gostei. Pequenininha.
A tal tirinha parecia um post-it. Se tivesse em casa uma coleção daquelas, certamente escreveria bilhetinhos lembrando a mim mesma as minhas atividades: Louise, análise amanhã, Louise, ligue para fulana, adoro escrever pequenas mensagens para mim. Jamais usaria aqueles delicados papéis para colocar meu sangue. Meu amigo não se importou com isso. Simplesmente se agulhou, com uma pontada de medo, seguindo com cuidado as instruções do manual.
- Não furou. Saco. Será que o meu dedo é mais grosso?
Aumentou para o nível 4, pré-pedreiro. Agulhada de novo. Não foi.
- Caraca, meu dedo é muito grosso.
Tentou dissimular o orgulho.
- Me fura. Meu dedo é mas fino.
- Não.
- Anda. Fura isso logo.
Estendi o indicador. Olhou minhas unhas, pintadas de esmalte Marrocos, uma cor meio marron, que não chega a café, talvez pela lembrança de vermelho no fundo. A manicure sugeriu, eu coloquei, caiu bem.
- Não. Você é muito delicadinha.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Insuportavelmente triste é acabar alguma coisa longa e envolvente.
Éramos cinco ontem na mesa do bar. Amigos de infância: não temos muito a ver, e não precisa; não lemos as mesmas coisas, não compartilhamos interesses, um quase não fala a língua profissional do outro. Que importa? Nada, absolutamente. Importa que um acabou um namoro-casório de sete anos, o outro um namoro de dois, a outra uma tese. Garçon, mais uma rodada.
Finalmente chegaram dois convidados atrasados. David Foster Wallace se sentou na cadeira perto da parede, para apoiar a cabeça. “I’m sad and empty as I always am, when I finish something long”. Já Clarice, a Lispector, foi mais breve: "Estou oca".
Vamos inventar outra paixão logo, loguinho. Para tudo se repetir.

Dizem que não sei fazer contas. Que ando de skate demais. E que skate não ajuda a saber matéria. Eu sei sim, eles é que não me entendem.

Marina na porta do colégio
-
uniforme
=
será que ela usa sutiã?

segunda-feira, 2 de março de 2009

(ih, eu tenho um blog)

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

"Ando mais rejeitada que jiló em restaurante a quilo."
J., sobre sua performance de paqueras aparentemente não exitosa.

"Estou aceitando até ex-hooligan."
J., para quem jilós e torcedores malvados têm certa conexão.

"Aí já é demais."
K., que prefere beringela e começou a temer pela amiga.

"Se um karateca lutar com um cara de kung fu, quem você acha que ganha?"
B., 10, para a garota mais graduada da turma, que deu explicações sem falar em sangue.

"Você não sabe aquecer no pique-pega."
B., 10, desafiando a mais graduada com o maior dos cinismos.

"Aí já é demais."
K., que não costuma perder a paciência, e achou melhor fazer polichinelos.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Futuro do pretérito

, se eu fosse uma mulher-bomba.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

O Can-Can é uma mistura da Polca e da Quadrilha e foi dançado pela primeira vez em 1822. Durante alguns anos, foi declarado ilegal, por ser considerado imoral e indecente.

O Can-Can é caracterizado principalmente por passos firmes e saltitantes, chutando alto e fortemente a perna. Normalmente o figurino consiste em meias de renda, botas de saltos altos, corpetes, penas na cabeça e saias de babados. Depois da liberação da dança, ela tornou-se muito popular por volta de 1830, e sua popularidade durou até 1944, quando então esta passou a ser apresentada em revistas e comédias musicais, principalmente na França. Originalmente, o Can-Can era dançado por ambos os sexos; hoje, entretanto, é dançado só por mulheres. As músicas mais conhecidas do Can-Can foram compostas por Jacques Offenbach. O pintor Toulouse-Lautrec pintou quadros célebres de dançarinas de Can-Can (Wikipedia. Estou apelando nessa reta final.)
*
Imaginei alguns homens dançando Can-can. Bruce Willis e muitos amigos. Um deles usa óculos e não consegue dançar direito, os óculos caem. Por que os homens pararam de dançar can-can? O mundo seria mais supimpa.
*
Pronto, zupt, lá se foram os três segundos de diversão.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Acho que virei um camundongo.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Espancarei até que estoure em berros

Osvaldo: O que você acha de mim?

Kent: Um canalha, um patife, um comedor de restos; um velhaco arrogante, estúpido, indigente, que tem apenas três roupas e meias fedorentas, um filho da puta covarde, sem sangue no fígado, que foge da luta e se queixa à justiça, trapaceiro afeminado e sabujo. Um escravo que herdou apenas um baú, que presta serviço numa alcova, um alcoviteiro; no fim, uma mistura de canalha, mendigo, covarde, rufião, filho e herdeiro de uma cadela bastarda a quem eu espancarei até que estoure em berros, se negar a menor sílaba do que eu disse agora.

***

Shakespeare, William. O Rei Lear. Mistura da tradução do Millôr com a do Jorge Wanderlei, edição minha. Para quem acha que o homem é só erudito, engulam essa. Sabe xingar como ninguém. Agora vou sair daqui dessa lan house fedida com esse adolescente tarado à esquerda e esse matador virtual à direita. Com licença.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Ensaio sobre as reticências

De todos os sinais de pontuação, são elas, as reticências, as mais instigantes.
Ao contrário do ponto, da vírgula, da interrogação, e até mesmo da exclamação, elas só existem no plural - como Vinícius, Rubens, parabéns e lápis. E eu adoro coisas que só existem no plural (fosse maior o meu despudor, mudaria meu nome para claras). Ainda que algumas pessoas usem a exclamação sempre no plural, normalmente em grupinhos de três, o fazem por desengano: o trio é uma propriedade das reticências, que, como piranhas de água doce, não sabem viver separadas.
As reticências afirmam, berram, pausam e, principalmente, duvidam. Daí a dificuldade de aplicação das três bonitinhas. São tantas as possibilidades que elas sugerem que é melhor eliminar algumas. Fazendo os devidos cortes, manipulando as informações aqui e ali, pronto, o ponto cai melhor. Ou a vírgula. Quem sabe um honestíssimo ponto e vírgula (esse também, cabe dizer, tem um parentesco com as reticências).
A exemplo da teoria da montagem cinematográfica de um russo cujo nome me escapa, me ocorreu algo como uma teoria da montagem das reticências, que comecei a fazer e, para variar, enfiei na gaveta.

Enfiei as reticências no mesmo lugar em que repousam a ovelha elétrica, um velho de Botafogo e um pianista de escuridões. Lá está melhor que cá, foi o que me disse o vendedor chinês do podrão de salgadinhos, querendo sair.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Rei Lear e meu primeiro suborno

Rei Lear expulsa sua filha Cordélia do reino e nega-lhe direito à partilha dos bens. Filha ingrata, esbraveja o rei. O policial foi mais brando que Lear e não gritou comigo:

- E aí, belezinha, teu namorado chega ou não chega com esse documento?
- Espera só mais um pouco.
- Só vou ficar mais meia hora. Se ele não chegar, vou te multar e apreender o veículo.

Alisou o revólver, fingi que não percebi. Eram cinco policiais, ostentando armas gordas, que acariciavam de vez em quando. Eu estava calma. Não gosto mesmo é de fuzil. Ia ficar ali lendo o Rei Lear até que o meu namorado chegasse com o documento. Kent diz para Lear: sou alguém de coração extremamente honesto, senhor, e tão pobre quanto o Rei.

Já era a segunda blitz que me pegava ali em Santa Teresa. Saco. Oito horas da manhã, eu querendo trabalhar, o policial ia e vinha e ficava parado do meu lado, escutando meus telefonemas, fingindo que não estava me vigiando, até que resolveu bater papo.

- Você trabalha no centro?
- É, ali na Rio Branco.
Sempre gostei de mentir.
- Com computador?
- Sou engenheira eletrônica. Crio softwares e bancos de dados.
Tomara que ele não me peça detalhes.
- Eu tô indo pra Polícia Federal em março. Passei no concurso. Vida de PM não dá, muito tiroteio, a gente é que faz o trabalho sujo.
- Legal.
- Eu vou lá pra Brasília. Aí não tem pra ninguém: vou desbancar juiz, ministro, qualquer um.

O cara se animou e eu com medo daquela porcaria de revólver disparar. Sai daqui, meu senhor, eu como tanta alface para morrer aos oitenta, um deslize e vou-me embora ainda com os peitos no lugar. Vários carros eram parados na blitz, um consolo e ao mesmo tempo uma triste confirmação: a maioria dos veículos, mesmo os que tinham problemas nos documentos, eram liberados com muita agilidade. Eu ali, tentando colocar em prática as lições de cidadania, enquanto Edgar dizia a Lear que estudava como evitar o demônio e esmagar piolhos.

- Belezinha, esse seu namorado não chega, não?
- Vai chegar, calma.
- Falei pro comandante que você é gente boa.
Dei um sorrisinho. Toca, telefone, toca, diz que eu vou sair daqui logo.
- O comandante me perguntou, será que a garota não quer pagar o meu almoço?
- O documento já está chegando, você vai ver.
- Me desculpe falar dessas coisas com você, prefiro tratar com homem.

Meu desapontamento foi maior que o de Cordélia quando eu soube que o plano não ia dar certo. Nada de documento. Não, não tem problema. Sim, já propôs o suborno. Não, eu não falei nada, foi ele mesmo. Não se preocupe, vou dar um jeito.

- Amigo, vou pagar o almoço do comandante.
O cara olhou pros lados, como se eu tivesse falado javanês, e foi com o canto da boca que sussurrou:
- Coloca em um envelope.
Como assim, meu senhor? Você acha que eu ando por aí com envelopes? Já deu sorte que eu tenho alguma nota, normalmente só uso dinheiro de plástico. Coloquei o dinheiro na única coisa que tinha para disfarçar o gesto, o exemplar do Rei Lear, e dei o livro a ele.

O PM pegou o livro sem pressa, olhou a capa, folheou as páginas. Parecia ter um certo gosto para teatro.
- Essa história é legal?
- Maravilhosa.
- Fala de quê?
- Do rei da Bretanha, que pretende dividir o reino entre suas três filhas, mas uma delas se recusa a...
- Muito bacana.

Me devolveu o livro assim que achou a grana, cravada no diálogo entre Gloucester, Lear e Edgar. Por uns dois segundos inocentemente pensei, ou melhor, desejei, e desejei muito, que aquele idiota levasse também o livro como propina. Quem sabe lesse. Quem sabe o filho dele lesse. Ou o comandante, entre a salada e a batata frita que eu estava pagando. Corrupto, ele? Eu. Mas viva. No Rio de Janeiro.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

"Jovens, envelheçam"
Nelson Rodrigues

Reforma ortográfica, uma ova.
Há coisas muito mais bonitinhas a se fazer com a língua portuguesa.
Eu prefiro falar camião
e o rins
e no meu acordo ortográfico todo mundo fala ih, lá vem o camião, justo agora que senti uma pontada no rins.

Logo estaremos todos unificados.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Quanto tempo dura uma lembrança?

Quanto tempo dura uma lembrança?

2008 todo, tirando talvez metade de junho e uns três dias de agosto, acaba de me durar dois segundos e meio.

(ok, acho que desconsiderei também um rabinho de dezembro)

Já as lembranças da infância no parquinho do Jardim Botânico começaram ontem e parecem não ter fim.

Pior mesmo, e isso me deixa meio indignada, são as mais intensas recordações que tenho dos meus filhos que ainda nascerão, dos comentários sobre o livro que escreverei, do preço salgado do creme anti-rugas que passarei, dos meus netos que reclamarão com voz aguda da minha inaptidão culinária. Essas são, com toda a certeza, as minhas recordações mais angustiantes.

domingo, 4 de janeiro de 2009

2009.
Que rufem os tambores.