domingo, 30 de novembro de 2008

Anã envenenada maçã

Deu no jornal:
Novos dados do IBGE dizem que população brasileira encolhe e envelhece

Li a notícia com lamento.
A informação é confiável: em breve nos tornaremos anões velhos. E mal-humorados, adiciono sem temor, embora o IBGE não tenha colhido informações sobre isso (o treinamento técnico para detectar mal-humor é caro e sofisticado). Seremos anões corcundas, de barba grisalha, que resmungam seus lamentos sempre repetindo a última palavra. Fulano está me enchendo o saco, saco. Beltrano se acha o tal só porque tem um centímetro a mais, mais. A população brasileira, encolhida e envelhecida, terá ainda mais medo dos gigantes das lendas dinamarquesas.

Como brasileira e futura anã velha, vou logo avisando que jamais aceitarei ser cooptada pela Branca de Neve. Prefiro ser anã da bruxa. Ou ser a maçã. Sempre quis ser a maçã envenenada. O IBGE infelizmente ainda não anunciou que nos tornaremos maçãs - embora as chances sejam bem altas.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O bocejo

O bocejo

O bocejo é o entreabrir da boca que denota sono.
Quer dizer, quando o bocejo nasceu , a ele comunicaram que só deveria se manifestar quando o sujeito sentisse sono. Mas hoje em dia, coitado, aparece em qualquer situação, menos quando a pessoa está com sono. Olavo bocejou em uam rave, no meio da multidão, u-rrú!, todos de bracinhos para cima, balançando a cabeça, tu-ti-tu-ti. Já Tânia bocejou bem no instante em que o professor chegava ao ápice de sua explicação sobre o sujeito pós-moderno. E Rita, imagina só, não só bocejou como caprichou no suspiro ao escutar do namorado a explicação sobre a viagem de fim de ano.

O bocejo está preocupado mesmo é com o seu contágio, que anda rápido demais. Ele bem sabia que quando aparecesse chamaria imediatamente uma porção de seres como ele. Só não sabia que a velocidade seria essa. Outro dia mesmo, no cinema, o bocejo se surpreendeu ao ver a quantidade de irmãos que encontrou em uma mesma cena. Era um desfile: um maior que o outro. E também se preocupou com o contágio rápido nas plenárias do planalto, nos escritórios e até mesmo nos inferninhos, em que supostamente o contágio de bocejos seria o menos preocupante.

O bocejo está pensando em tirar férias. Glória ficou preocupada, pois não consegue viver sem bocejar.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Notas de rodapé

Adoro escrever notas de rodapé. Mais que o texto principal, mais que os títulos e subtítulos, me divertem e me encantam as notas de rodapé. Que há de mais importante, meu deus, em qualquer texto, do que aquilo que poderia ser suprimido e não foi? A nota de rodapé é isso: eu poderia não te contar esse detalhe, mas acho que vale a pena. Force sua vista, troque o óculos, você vai gostar de ler esse tiquinho de informação que eu coloquei aqui. É um segredo.

A nota de rodapé não é como um PS, por exemplo, que comumente é usado para fazer piadinhas. Como se depois do "beijos, fulano" acabasse o espaço da seriedade e finalmente no PS fosse aberto espaço para os gracejos. Nada disso. O rodapé traz um charme especial que só possuem as coisas marginalizadas, esquecidas e ao mesmo tempo imprescindíveis.

Quando clico em "inserir-nota", meu cérebro entra na deliciosa configuração do sussurro. Atenção, leitor, encoste seu ouvido aqui bem pertinho desse rodapé, vou te contar uma coisa que só você pode ouvir e que vai fazer toda a diferença.

Estou pensando, por que não, em trocar as bolas e escrever tudo em notas de rodapé. O texto principal fica ali, na margem das notas.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

às vezes tenho quase certeza,
mas quase certeza mesmo,
de que não sou uma salsicha.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

anti-post espanta leitor

A ovelha está se escondendo atrás do título.
(sai daí, Amélia!)
Ela não quer me obedecer.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Houve uma época em que vivia cercada por poesias. Copiava poesias em letras bolhudas, dobrava o papelzinho e colocava na carteira, na pasta do colégio, no estojo dos óculos. Abria o livro de química e, uau!, alguns segundos de João Cabral no meio da manhã. Ia comprar Chicabon e me deparava com Plath na carteira. Isso sem contar com Pessoa, que me pegava desprevenida enquanto enquanto comia um joelho no chinês, e com Prevert, que apareceu bem quando me insinuava para aquele menino do colégio que nunca me deu bola (tudo bem, ele era da oitava série e eu da sétima, meninos da oitava são muito maduros).
Um belo dia, enchi da brincadeira. Achei bobo demais eu mesma provocar minha pequenas diversões ao longo do dia. Cresce, garota. Um, dois e três. Nunca mais futuquei a bolsa e achei poesia em vez de cartão de crédito.

Dia desses estava procurando um texto acadêmico que tinha que ler pro dia seguinte. No meio da pilha monstra de cópias aterrorizantes que acumulam pensamentos sufocantes, encontrei um papel. Era pequeno e estava dobrado em quatro. "Felicidade se acha é em horinhas de descuido", ele me dizia. O verso, bem se sabe, é de Guimarães Rosa. Mas não a letra, que remoí bastante e constatei que não era minha, nem aos sete, nem aos oito, nem aos dezoito anos. E possivelmente não será aos sessenta.

Acho que já sei quem foi.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

conchinha

"Não gosto de dormir de conchinha".
M., pouco antes de pedir aipim frito.

"Eu também não, espero meu namorado dormir e saio da concha."
F., tentando desentupir o saleiro.

"Se ele se mexer do outro lado da cama eu já acordo. Conchinha, então, nem pensar."
G. Y., tentando não se irritar ao tirar sal da orelha.

"Ô."
J., dando mais um gole.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Queria fazer um texto maravilhoso sobre o processo de criação. Especificamente, sobre como algumas pessoas pensam em palavras e outras em imagens e como se pode subverter o que for mais intuitivo através de técnicas. Daí me deu preguiça e eu não escrevi nada.

Ultimamente duas coisas me tomam o pensamento:
a palavra assaz
e a imagem de uma porta-bandeira ateando fogo às próprias roupas (imagem muito bonita, aliás).
Assaz, fogo, assaz, porta-bandeira.
Nada disso tem relação direta com o que deveria ocupar meus pensamentos. Sim, eu sei o que deveria ocupar meus pensamentos.

Vez por outra eu ainda me pergunto por que estou pensando em assaz em vez de pensar as coisas que deveria pensar. Mas aí essa idéia me foge e lá estou eu de novo com a porta-bandeira, que quase já tem nome.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Não há pombos nos arredores da Paulista.

Estou abstinente: preciso chutar um.