terça-feira, 29 de abril de 2008

O meu tio viaja muito, para lugares longe daqui, onde só dá pra chegar de avião que voa bem alto, e ele sempre volta cheio de presentes, e contando muitas histórias e eu gosto muito. Meu tio me contou que na China os homens têm o cabelo liso e o olho puxado e um cheiro fedido de cebola ardida com vinagre. Meu tio disse que eles lutam espadas muito bem, e também artes marciais, e que lutam no meio da rua e em qualquer canto, até mesmo no cemitério e no foguete indo pra lua, e um deles até tentou desafiar o meu tio quando ele tava num restaurante, mas não conseguiu, porque o meu tio sabe magia negra e acabou imobilizando o chinês no pensamento, antes mesmo dele pegar a espada.

Meu tio disse também que foi visitar o túmulo de um moço chamado Mao-Tsé-Tung, um chinês que também tinha o olho puxado e que fez uma coisa muito boa lá na China que se chama revolução, e falou que o Mao-Tsé quando viu o meu tio não agüentou ficar parado no caixão e acabou levantando só para falar com ele e apertar a mão dele. Depois o meu tio contou que os chineses que moram na China não comem nada disso de pastel com caldo de cana, comem mesmo é cobra, macaco e até escorpião. Mas nisso eu não acreditei, que eu não sou boba nem nada.

Lições de metrô

O metrô do Rio tem um plano secreto e eficaz: civilizar seus passageiros. Não é difícil perceber, principalmente naqueles ônibus de extensão. Você entra, o cobrador ou motorista está feliz, te diz bom-dia, o ar-condicionado está funcionando. Ninguém esbaforido. Ninguém se encosta muito, mesmo que haja uma certa lotação. Todos escutam a música, invarialmente clássica e alemã, que está tocando. Não se pode flertar o jornal do outro. No máximo, discretamente verificar o livro do amigo de banco, mas só o título, não ouse acompanhar um parágrafo. Deixe-o com sua leitura, enxerido. Civilidade total.

Dentro da estação, o metrô é imperativo nas lições de boa educação aos passageiros. Elas gritam nas paredes e no chão: tire a mochila, não fique embarreirando a porta, respeite o vagão de mulher, e, se quiser cantar um pedaço dessa música clássica, faça baixinho.

Pois bem. A senhorinha comentadora na minha frente - há uma legião delas espalhadas por aí - estava inquieta observando um rapaz. Virou-se para mim e, meio surda, gritou: "aquele ali não parece um jagunço?". Parecia. Idêntico. Com um civilizado rabo de olho percebi que o dito rapaz prestava atenção e esperava a minha fala, mas não queria eu deixar a senhora sem resposta. Estava ensaiando um civilizadíssimo "nunca vi um tão jagunçado" quando fui interrompida pelo anúncio do metrô, que dizia que a próxima estação era o Catete.

A senhora: Catete? Catete não quer dizer nada. O que importa é o cacete. Não acha?

segunda-feira, 28 de abril de 2008

o tédio

Proclamo-me contra a palavra tédio. É uma contradição em forma de letras. Vai da tensão ao extremo alívio, do grito à resolução: como poderia, então, ser enfadonha como se propõe? Para pronunciá-la, temos que abrir a boca com um certo sorriso, colocar a língua entre os dentes da frente, concentrar-nos e então té, imprimir um primeiro ruído de força, como um grito de desepero, ou uma lembrança de agonia. E depois, algo imperceptível, um dio arredio e acomodado, como uma solução tomada que é há muito sabida. Muitas transformações para as cinco letras da modorra.

A palavra inconstitucionalissimamente, que me gabava de conseguir falar aos seis anos, parece mais adequada. Vou promover a substituição: em vez que falar, que tédio, direi, que inconstitucionalissimamente!

quinta-feira, 24 de abril de 2008

A despeito de minhas frescurites e fobias, em relação às lagartixas não nutro nenhum nojo. Há várias passeando pelo meu lar, e não me incomodam, nem a estranha textura de sua pele, nem o olhar sonso para os mosquitos, nem o susto quando se acende a luz. Sobre as lagartixas, só uma coisa me incomoda: elas procriam. Daí nascem as baby-lagartixas, essas sim, muitíssimo horrorosinhas. Rabo fora do lugar, pele indefinida, inábeis com os os insetos mais idiotas. Tenho absoluto pavor. Preferia que fossem camaleões. Ou um besouro, uma fruta do conde, um cartucho sem carga. Mas baby-lagartixa não dá.

domingo, 20 de abril de 2008

jura?
é mesmo?
como assim?
nada mais me choca.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Meia quinta-feira e três descobertas:

1. Melodrama e psicanálise têm uma relação secreta e absolutamente analógica.
2. Sensacionalismo e narrativas melodramáticas nem sempre andam juntos.
3. Perto do joelho também brota celulite.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

ufa.
ufa.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Os pedreiros das Laranjeiras acabam de bater um prato e se ajeitam pra dormir. Uns de barriga pra cima, uns de lado e outros até sentados. Dormem de roncar e babar. Não se incomodam com quem os pula na calçada, nem se der um esbarrão leve.
Os pedreiros das Laranjeiras têm hábitos madrilenhos.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Li o horóscopo hoje. Touro. Umas cinco linhas de letra miúda no jornal paulista. Elas me responderam com eficiência ao que eu nem sabia que tinha me perguntado. Que alívio. Isso de ser sobredeterminado faz um bem danado.

sábado, 5 de abril de 2008

Méééntiras

Amélia levantou serelepe e veio falar comigo: méééé. E acabou chamando a atenção de Helga, que estava pastando na maior letargia, mas não se conteve e me chamou a atenção: mééé. Até Suiane, tímida que só, mééé deu uma sacudida. Daí eu respondi: cacilda!

Quando criamos esse blog, eu e as ovelhas não sabíamos o que aconteceria. A intenção era simplesmente exercitar aquilo que melhor fazemos: pastar. Daí nasceu um blog sem proposta, sem lógica e, principalmente, sem leitores. Um ano depois, tudo continua na mesma, com a diferença de que a página tem fiapos de lã espalhados por todo canto (desculpem a bagunça, eu já pedi para as ovelhas arrumarem, mas elas não mééé escutam). Ah, e agora algumas ovelhas de pastos alheios vira e mexe passeiam por aqui. Como você, méééu querido.

O nome com que batizamos esse reino de faz-nada gerou várias confusões. Como é mesmo, hein? Galinhas que dizem pi? Ursos que gemem mu? Cobras que gritam xi? E o ápice: espermatozóides que dizem flai? Vejam bem, olha o respeito, isso aqui é um pasto. O nome rememora os queridos cavaleiros que dizem ni. E eu não sei o barulho que faz um espermatozóide. Posso desconfiar, mas não tenho certeza.

Na era da escassez de tempo para qualquer outra coisa que não seja trabalho-alho-alho, chegamos a uma anti-conclusão de primeiro aniversário: que todo mundo pasta. E que as ovelhas vão continuar dizendo mééé. Não é mééésmo, felpudas?

(Pronto, Helga, Amélia e Suiane. Podemos voltar.)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

gogouar-se

A incrível saga
do verbo irregular reflexivo de primeira conjugação
que caiu na era da pós modernidade:

eu me google
tu me goolgas
ele te goolga
nós vos goolgamos
vós nos goolgais
eles se goolgam

(e todos continuam sem saber quem são.)

quarta-feira, 2 de abril de 2008

O verbo tem que pegar delírio.

(MB)