domingo, 30 de setembro de 2007

escriba em crise

nao, nao abra a boca.
ja sei o que voce vai falar.
todos os dialogos ja foram escritos.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Eu e Marcel Marceau

Por bem conjugar verbos no passé composé, ganhei de minha professora de francês dois ingressos para assistir a uma palestra de um artista francês muito importante. Eu tinha treze anos e cabelos muito compridos, e minha mãe prontificou-se a me levar.
Antes da conferência, esmerei-me em revisar meu conhecimento no idioma: conjugações, vocabulário, e, principalmente, verbos irregulares, que vira e mexe me confundiam. Escutei umas fitas cassete que acompanhavam o livro didático, para despertar o ouvido e não perder nenhuma palavrinha sequer do artista. Tirando os repórteres da TV francesa e alguns gringos assanhados, nunca tinha ouvido nenhum francês falar, ainda mais um artista.
Fui para a tal palestra. Minha mãe segurava minha mão, para que eu não me perdesse. Era muita gente, com pernas muito compridas. Finalmente sentei, e o tal artista não abria a boca. Mas, que esquisito, eu bem o entendia, com mais clareza que qualquer passé composé. Ele falava com as mãos, o umbigo, o fio de cabelo mais curto, o dedo mindinho do pé esquerdo, os pêlos das narinas, a vértebra de número 13. Falava com as pré-palavras, quem sabe. Com algo que está na cabeça e no peito, e, que bestas, nem nos damos conta. E assim conheci a não-linguagem-universal do maior mímico do mundo, Marcel Marceau. Nessa língua, não existem verbos irregulares.

Agora Marcel Marceau está falando com os fantasmas. E eu aposto que a não-língua deles é igualzinha à nossa.

domingo, 23 de setembro de 2007

branca

momento de tensão:

será que a maçã da Branca de Neve
tinha agrotóxico?

(isso pode mudar toda a história)

Dia de feira

Domingo é dia de feira.
No horti-fruti, as frutas vêm sem agrotóxico.
E, pior, sem feirante.
Quanto ao agrotóxico, eu não tenho nada a comentar.
Quanto ao feirante, esse sim faz muita falta. Até tentei interagir com uns funcionários, mas eles responderam "a senhora estaria procurando alguma coisa?", "como posso ajudá-la?". Céus. Funcionários uniformizados, prova de fruta em potinhos separados. Lá se foi o tempo em que os feirantes eram livres.
Fiquei pensando que o horti-fruti, como empresa preocupada com o bem-estar seus clientes, podia oferecer um curso de feirante para aqueles funcionários. Algo do tipo, lição 1, só falem berrando. Gesticulem muito, principalmente com os braços. Elogiem todas as menininhas e também as senhorinhas. Ofereçam provas da mão de vocês, e não separadas em um potinho embalado a vácuo. Não usem luva, nem máscara. Errem a concordância verbal.
Sabe como é, "menina bonita não paga mas também não leva" faz falta no domingo do ser humano. Pelo menos do meu ser humano.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Cascavel

Nunca fui chegadíssima em geografia, mas ultimamente estou aprendendo muitas coisas importantes sobre cidades brasileiras.

Sobre Cascavel, no Paraná, eu sei que:
1. É a primeira cidade do mundo em que aconteceu um gol de goleiro.
2. É a cidade com mais dedos do Brasil.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

desembaçando

Do meu avô, tiraram o baço.
Como eu não sabia muito bem o que era baço, fiz uma cara de triste.
Daí perguntei pra minha prima o que era baço.
Ela disse um monte de palavras com ócito.
E eu continuei sem saber se o baço se parece mais com uma xícara,
com o pôr do sol,
ou com os cavaleiros do zodíaco.

Daí falei pro meu avô:
Ih, vô, relaxa.

O baço só embaça.

O baço
é chato
à beça.

(silêncio)

domingo, 16 de setembro de 2007

a sujeira

O nome da sujeirinha
que se acumula no umbigo
é flunfa.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

o velho engolidor de insetos

o velho não sabia se me fitava com curiosidade, ou se me dizia o que tinha para dizer. enquanto pensava, tateava a parede, pegava com força e engolia um dos muitos insetos que se arrastavam pelas paredes daquele sobrado colonial.

afinal balbuciou alguma coisa. me diga logo o que quer que eu adivinhe, eu não estou aqui de brincadeira. e engoliu uma traça.

meu coração sobressaltou. como aquele velho sabia que eu estava desejoso de uma adivinhação? quem adivinha a vontade de adivinhar bom adivinhador será. sempre quis que alguém proclamasse o meu futuro para eu mesmo não ter trabalho de ir adivinhando a minha vida ao mesmo tempo em que construo. dá trabalho pra cacete. você devia ter nascido com manual de instrução, minha ex sempre dizia isso. amassei uma formiguinha entre o indicador e o polegar e pensei, ainda se fazem bons pais de santo nessa merda de país. enquanto me livrava do inseto e limpava o sangue na camisa, fiz a pergunta ao velho.

agenda

Já perdi duas agendas esse ano. Eu compro, anoto coisas, vejo meu dia-a-dia organizado, e pimba, perco. Quando perdi a segunda agenda 2007, resolvi que a minha agenda seria a minha cabeça. Afinal, essa eu não posso perder, né? Quem dera. Nada é mais perdível que a própria cabeça. Pelo menos a minha. Me bateu um desespero. Por Júpiter, como vou decorar essa penca de prazos para entregar coisas, festas, colação de grau, burocracias da vida? Terei que contratar um lembrador profissional? Alguém para ficar me ligando e lembrando? Clara, leia isso. Escreva. Clara, beba água. Vá ao banheiro. Clara, cadê o vestido para a festa de domingo? É hora de fazer exame de sangue. Muito bem, Clara.
Estou tentando evitar o lembrador profissional, apesar de já ter dado uma espiadinha nos classificados. A estratégia agora são os post its no monitor. Minha tela tá hiper carnavalesca, um monte de papelzinho penduradinho. Todos os meus prazos estão ali. Vamos ver se dá certo. Tomara que não bata um vento e leve tudo. Se isso acontecer, acho que vou para a praia.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

os cabelos de Clara

Existe uma cena que se repete todos os dias na minha vida: eu, desesperada, insandecida, alucinada, procurando um prendedor de cabelo. Tateio bolsos, mesa, computador, banheiro, mochila, marmita, bolso, mesa, ei, peraí, acho que já procurei por aqui. Enquanto isso, posso jurar que meu cabelo cresceu três metros, está esvoaçante, ameaçando entrar na minha boca e invadir minhas orelhas.

E por que você não corta o cabelo, ô anta?, me perguntaria alguma amiga com certo senso de razoabilidade. Ok, ter cabelo curto soluciona muitas coisas. Mas, mesmo quando o meu estava menor, queria prender e ficava agoniada para achar um elástico. Muda a qualidade do prendedor: para cabelos curtos, grampinhos trés chic, e não elásticos gigantescos. Mas não adianta cortar, o problema continua. Tem uma hora, momento certo e inevitável, em que o cabelo atrapalha. Estive refletindo sobre isso e concluí que é a proximidade com o cérebro. Vai que os meus já escassos bons pensamentos escapolem pelos cabelos e vão parar no meio da rua? É por isso que sempre tenho um prendedor por perto. Em algum lugar que ainda vou encontrar.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

as risadas

Atrás da porta, ouço risadas. O velho entra, eu fico do lado de fora. A porta entreaberta deixa escapar uma luz intermitente, que em nada combina com o cheiro agudo e desesperante de bicho podre que vem do mesmo lugar. As risadas pesam no ar. O velho percebe que não entrei e retorna a porta, abrindo-a mais um pouco. Tento espiar, mas não adianta.

Risadas sempre me amedrontaram. Nunca consegui me convencer de que risadas seriam expressão de felicidade. A felicidade não tem ruído, é seca e muda. Risada ou é nervosismo ou conivência social. Mas as que saíam daquela porta, eu não saberia definir. "É aqui, venha ver!", o velho me seduzia. Dei um passo à frente. O mural na parede me fitava. A rua lentamente ficava para trás, e eu entrava em outra dimensão.

domingo, 9 de setembro de 2007

tropicália

ontem fui na exposição da tropicália, no mam.
ok, como pessoa mega-blasé-cult-informatizada-com-óculos-de-armação-quadrada,
eu deveria comentar a curadoria da exposição, as obras dos principais artistas, os andaimes, as experiências sensoriais de clarck e oiticicca, o concretismo.
mas eu não vou fazer isso.
então, se vc não gostou, já pode parar de ler.
o fato é que, quando saí de lá, eu descobri que o caetano está velho.
o gil está velho.
a rita lee, gagá.
se passaram uns trinta anos e nada do que eles falavam mudou - ou quase nada.
se passaram uns trinta anos e isso aqui continua sendo o país do futuro.
se passaram uns trinta anos e nenhum de nós jovenzinhos ferve de revolução,
de inovação, de dar a cara para bater.
e trinta anos, meus caros, não é nada.
daí uma coisa passou pela minha cabeça:
taqueospariu.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Ovelhas invadindo

Julita andava com uma mania de funk. Vivia cantando e rebolando o traseiro felpudo de ovelha jovenzinha. Helga não gostava muito daquilo, estava muito entretida com suas leituras de Marx no original alemão. E Amélia andava cheia de tédio, querendo aprontar alguma.

- Ovelhas, este blog anda muito sem-graça!, resméngou Amélia.
- Méééé, todas concordaram.
- Temos que mudar a diagramação, agitar os comentários, fazer alguma coisa!
- Mé-méééé!, as ovelhas adoraram.
- Já sei, disse Helga, desgrudando os olhos do original alemão. Precisamos sair dessa tela de blog. Vamos invadir a barra de endereços! Não aguento mais essa prisão. Vamos colocar a nossa marca lá em cima! Quem concordar, grite mééé!

Todas gritaram, menos Julita, que puxou um sonoro ú-ú-vamu invadí. Êta ovelha revoltada. Ao ritmo do funk, nossas ovelhas queridas conseguiram chegar à barra de endereços do navegador, lutaram fortemente contra o ícone residente e o desbancaram.

Viva as nossas ovelhas! Agora elas estão na barra de endereços, deixando a internet mais ovelhísticamente hipertextualizada.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

meu dicionário

Urra - diz-se do que o ser humano faz quando leva um belisco.

Surra - Algo não muito próximo de carinho. Para ser mais clara, foi o que Mário deu em João. Também, assim não dá, me contou Mário, um belisquinho até vai, mas três, e na nuca, merece uma surra.

Sussura - O que fazem os apaixonados e os que guardam segredo. E também João, que depois da sova sussurou para Mário: eu ainda te pego, Mário, com meus dedinhos belisquetes...

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Santos

Esse fim de semana eu tive o infortúnio de ir para Santos.
Antes de conhecer, eu sabia que essa era a cidade dos Mamonas Assassinas e da estrada do Roberto Carlos.

Agora eu sei que:
Em Santos, o tênis desamarra toda hora.
Em Santos, nenhuma caneta funciona.
Em Santos, todos os taxistas são surdos.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

A autora se apresenta

Ok, vamos lá.

Meu nome é Clara Fernandes Meirelles. Não nasci em dezembro, não falo chinês e não sei fotografar. Há um tempo atrás, não gostava de berinjela. Não pratico esportes radicais. Não curto quem dá esporro em criança. Não consigo andar em perna de pau. Não sei fazer mapa astral e não sou devota de Santa Rita de Cássia.

Meu nome é Clara e tá super na moda. O Fernandes veio de algum lugar não muito distante. O Meirelles veio da Espanha. E eu vim da barriga da minha mãe, assim como vocês - das suas respectivas mães, ô engraçadinho. Não sei de onde veio o mundo, mas aposto na teoria do big bang. Se bem que aquela da criação é bem divertida.

Esse ano decidi explodir minha vontade de escrever em algum lugar. Daí, óóóó, acabei entrando nesse mundaréu de blogs da internet, minha principal maquininha de diversão. Ganhei uns concursos de literatura por aí, que me renderam publicações em livros. Escrevo crônicas, contos, textos infantis e coisinhas non-sense.

Ah, importante: adoro mate com limão. Principalmente o do galão. E acho kiwi o mamífero mais divertido do mundo.

(E o blog saiu do anonimato...)