terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Algodões 2: abóboras, rebatedor

Até hoje me lembro do seu espanto quando olhou aquelas abóboras no chão. Um vegetal que dá no chão? Como se toda fruta tivesse que nascer em árvores, para cair na cabeça de alguém e provocar a inspiração para a ideia que vai mudar a história. A abóbora nunca mudou história alguma. Mas esteve na nossa. Naquele dia, eu me arrependi de ter ido com você a Algodões. Algo me dizia, e eu não quis acreditar, que jamais deveria ter ido com um sujeito que conhecia havia dois meses para um lugarejo do sul da Bahia. Eu, que não suporto nem um domingo a dois em Paquetá.

O convite para a viagem veio em um mate que tomamos na praia. Você cavou um buraco na areia, apoiou o copo. E me convidou. Bahia. Descanso. Paz. Nós. Dois. Eu sorri, tentei ser leve, mas sei que saiu forçado. Eu não sei sorrir amarelo, você deve ter percebido. Antecipei a viagem em pensamento e só sentia o medo de estar com você naquela cidade, longe de tudo, e sozinha; de não conseguir sair da cidade. Acima de tudo pesava, mas só descobri isso muito depois, não saber ao certo quem era você, apesar da nossa súbita intimidade para uma relação de apenas dois meses. Pensei tudo isso. E respondi: marca o vôo para a parte da manhã.
Engraçado como se confia em uma pessoa por pouca coisa. Eu confiava em você pelo seu gosto musical.
Como se pode ser tão idiota?

Olha ali a namorada do fotógrafo, dizia a produtora da equipe, lá vai ela com o rebatedor. Nos primeiros dois dias, eu fui a carregadora oficial de rebatedor. Devo a esse oficio o fato de, hoje, conseguir discernir as luzes, e apenas por isso não me arrependo.
Gosto de luzes, especialmente da que bate nas folhas da aboboreira, pela manhã. Há frutas, como as abóboras e os kiwis, que surpreendem ao serem abertas. Não se pode adivinhar como são por dentro, nem mesmo quando tocadas. Impossível imaginar, olhando por fora, a cor da polpa. Mesmo em uma foto que não esteja em preto e branco.