Como todas as pessoas que, de algum modo, vivem de ter ideias, eu tenho um caderninho. Depois de tentar dividir as seções por temas, por trabalhos, por situações amorosas e o escambau, percebi que, para uma pessoa completamente desordenada como eu, o melhor seria separar o caderninho por datas. Assim que pus meus pés na capital argentina, abri uma parte. Dobrei uma pontinha de uma folha - veja como é fácil abrir um espaço na vida - e escrevi, em garrafais vogais: Buenos Aires.
Aqui estou.
Meu método de caderninho funciona assim: anotar o que passa na cabeça. Anotar uma palavra. Anotar algo ouvido. Anotar uma besteira pra completar depois. Anotar. Minha parte Buenos Aires começa com um punhado de sensações físicas da cidade: a arquitetura, as ruas, tudo muito diferente do meu porto natal. Depois, caminho por frases que escutei, li, inventei. Mais recentemente, pensatas sobre o que é ser e querer ser um estrangeiro.
Algumas delas. Sou estrangeira porque:
- Não sou nativa da língua. Mesmo que me comunique bem, me delato em uma frase.
- Deixei de ir a uma festa porque cheguei no lugar e não entendi que aquilo podia ser uma festa.
- Tenho que me apropriar dos lugares, torná-los meus. A calle Ayacucho é minha. O bilheteiro do metrô é meu amigo.
- Porque eu vejo diferenças o tempo todo. Mesmo que não queira.
- Porque tenho um espanto por dia, mesmo que pequeno. Se não tiver eu forjo.
- Porque adoro me espantar com as coisas.
- Porque vim aqui pra me espantar.
- Porque estou sempre fora.
domingo, 17 de abril de 2011
Postado por Clara às 18:03
Marcadores: Buenos Aires
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2 comentários:
Você já se espantou com as garrafas ou galões de água em cima de alguns carros? Sabe o que isso significa? Eu demorei anos pra descobrir! hahaha
Beijos
Vim para o Rio há um ano e, só depois de escolher uma tarde inteira de domingo na cama comendo biscoito, digo: moro no Rio.
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