Eu ouço, mas ele não está tocando.
Eu ouço, juro que escuto, mas ele não está tocando.
E isso não se passou uma só vez, não. Vira e mexe tenho a mais límpida sensação de que estou escutando a musiquinha nervosa que coloquei no celular. Cavuco a bolsa com pressa, jogando pros lados os grampinhos de cabelo, as canetas coloridas, os papéis do banco, as moedinhas e um naco de maçã que devia ter jogado fora. Quando finalmente encontro o celular, nada. Ele não havia emitido um ruído sequer. Nem esboçou um tremelique.
Preocupada com a minha situação mental, relatei a alguns amigos tal infortúnio. E qual não foi minha surpresa quando descobri que muitas pessoas sofrem do mesmo mal, que acabo de diagnosticar como como "síndrome da chamada muito esperada". Ora pois, não é isso que estamos fazendo quando escutamos o que não estamos ouvindo? Tentando ouvir a todo custo uma tal ligação. Os neurônios enganando os tímpanos. Meu irmão futuro-doutor me deu explicações de base científica para o fenômeno, com muitos sufixos esquisitos e palavras de origem cósmica, as quais confirmaram com rigor o meu diagnóstico.
Agora fico me perguntando: de quem seria a chamada que escutei sem ouvir? Poderia ser do entregador de cartas, um sujeito simpático pra dedéu. Ou da manicure, que finge interesse nas minhas respostas. Poderia ser da avózinha, via além-orelhão, ou da Prima Bolha, meu personagem infantil predileto. Quem sabe fosse o General, protagonista do romance que estou lendo. Ou o mendigo que invejei porque tomava banho num chafariz. Talvez pudesse ser a garotinha que arriscava respostas para o monitor da exposição. Mas também poderia ser o Stallone - embora esse não tenha o meu telefone.
domingo, 30 de março de 2008
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Um comentário:
Eu, todos os dias, pergunto se não chegou correspondência pra mim.
É o mesmo mal, à moda antiga.
Mas o irmão dotô tem explicação científica pra isso?
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